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É possível a absolvição daquele que foi preso por participar de racha?

Recentemente li notícias acerca da deflagração de operações policiais visando coibir a prática do crime previsto no artigo 308 do Código de Trânsito Brasileiro, o qual se refere ao “racha”.

Todos têm noção do que é o “racha”. No entanto a definição precisa consta do referido artigo, que possui a seguinte redação:

Art. 308. Participar, na direção de veículo automotor, em via pública, de corrida, disputa ou competição automobilística ou ainda de exibição ou demonstração de perícia em manobra de veículo automotor, não autorizada pela autoridade competente, gerando situação de risco à incolumidade pública ou privada:

Participar de “racha”, grosso modo, é conduzir veículo em corridas automobilísticas não autorizadas, em via pública, gerando situação de risco.

A pessoa que for surpreendida participando de tais competições será presa e conduzida à delegacia de polícia para que seja lavrado o auto de prisão em flagrante.

Posteriormente haverá processo com a apresentação de acusação e defesa; ao final o juiz vai condenar ou absolver. De forma bem resumida é assim que funciona.

Pois bem, o simples fato de o condutor ter sido preso não significa que será condenado; é necessária a demonstração da sua culpa no decorrer do processo. E chamo a atenção para esse fato em virtude das alterações que foram sendo feitas no Código de Trânsito.

Em 2014 entrou em vigor a Lei nº 12.971 que alterou a parte final do artigo 308 para que passasse a constar a seguinte expressão: “gerando situação de risco à incolumidade pública ou privada”.

Essa expressão substituiu a anterior, qual seja: “desde que resulte dano potencial à incolumidade pública ou privada”.

A diferença entre ambas é a seguinte: até a edição da lei aquele que participava, na direção de veículo automotor, de corrida não autorizada praticava o crime de racha desde que sua conduta gerasse “dano potencial”.

A partir dela a ocorrência do crime está subordinada à constatação da “situação de risco”.

Isso significa que o condutor somente poderia ser condenado se o promotor de justiça conseguisse comprovar que sua conduta efetivamente colocou em risco a incolumidade pública ou privada, ou seja, deveria haver a demonstração da probabilidade concreta da ocorrência do dano, não uma mera possibilidade abstrata.

Em tempo, incolumidade é a qualidade de incólume, ou seja, livre de perigo.

Atualmente, segundo a visão de alguns, para a condenação basta que a condução do veículo gere “situação de risco”.

Dito isso não seria mais necessária a demonstração de que a conduta do motorista tenha efetivamente o potencial, a probabilidade de efetivamente causar danos; bastaria a comprovação de que seu comportamento gerou situação de risco, ou seja, a possibilidade de causá-los.

Antes se tratava de um perigo concreto, agora exigir-se-ia um perigo abstrato.

Essa, aliás, é orientação que emana de alguns julgados que consultei no âmbito do Superior Tribunal de Justiça. A título exemplificativo sugiro a leitura do AgRg no REsp 1852303/ES.

Contudo é importante esclarecer que quando a lei menciona que a conduta, para ser crime, deve gerar situação de risco, esse risco deve ser para algo ou alguém.

Assim, se a acusação não conseguir comprovar que a participação no racha gerou risco a pessoas ou coisas não há que se falar em crime. Seria o caso de absolvição, portanto.

Para concluir entendo que o crime de racha continua sendo de perigo concreto, ou seja, a acusação deve comprovar que a conduta do motorista gerou um efetivo perigo de dano, provável, à incolumidade pública ou privada, não uma mera possibilidade abstrata destituída de fundamentos concretos.